A cana-de-açúcar teve origem na Ásia e foi disseminada pelos árabes por todo o Mediterrâneo, tendo chegado ao Novo Mundo pelas mãos dos colonizadores portugueses e espanhóis.
Plantada no Brasil, logo no início da colonização, trouxe destaque ao país, como nos conta Gilberto Freire em seu livro “Açúcar”: “O açúcar passou a dar renome ao chamado Brasil. Mais do que nome: renome… no açúcar estava uma fonte de riqueza quase igual ao ouro”.
Verdade, na Europa Medieval e Renascentista, o açúcar era considerado especiaria, acessível apenas aos nobres e abastados, que a compravam em boticas, pagando seu peso em ouro.
Outro subproduto bastante conhecido da cana é a rapadura. O livro “Arte de Cozinha Brasileira” define rapadura como açúcar mascavo coagulado, a que se dá a forma de pequenos tijolos. Definição interessante, já que o ponto da rapadura é anterior ao do açúcar mascavo, de forma que mais certo seria qualificar a rapadura como um subproduto prematuro da fervura do caldo de cana, que nos dará também o melado e o açúcar mascavo propriamente dito.
Até onde se sabe, a rapadura teve origem nas Ilhas Canárias (Espanha) como um meio prático para transporte e armazenamento de pequena quantidade de produto destinada a uso individual. O nome vem de “raspadura”, originando-se da prática de raspar os lados do tacho na hora de colocar nas formas retangulares.
Gilberto Freire afirmava que seu uso a tornava mais do que um adoçante, substituindo a carne ou servindo de coadjuvante nas refeições sertanejas, prática alimentar observada também em outras regiões do país, como no chamado Brasil Caipira.
No Vale do Paraíba e na Serra da Mantiqueira ainda é muito apreciada, tanto em sua forma tradicional, como em outras variantes, tais como a “taiada”. Neste doce, considerado típico do Vale do Paraíba, a rapadura ganha a companhia da farinha de mandioca e do gengibre.
Em nossas expedições pela Mantiqueira tivemos a oportunidade de conhecer Adelmo Vieira, sitiante no bairro dos Coqueiros, em Paraisópolis, cuja família produz rapadura há mais de 70 anos.
Seguindo a tradição familiar, Adelmo inicia o processo às 3h30 com a moagem da cana cortada no dia anterior e armazenada próxima ao moinho, que tem mais de 50 anos. A garapa resultante do processo segue por uma tubulação diretamente ao enorme tacho de cobre, comprado na cidade de Cláudio, Minas Gerais. Ali, os 240 litros de caldo (medida do tacho) passam pelo processo de fervura, que normalmente dura muitas horas até que se apure o ponto. Nas contas do Adelmo, o melado leva 4 horas, a rapadura 5h30 e o açúcar mascavo 6h30. Com essa quantidade de caldo é possível produzir 80 rapaduras ou 40 kg de açúcar mascavo.
No caso da rapadura, a fabricação ainda envolve bater a massa no cocho de madeira, colocar nas formas, esperar o endurecimento e depois desenformar. Fiel à qualidade do produto, ele afirma que muitos produtores optam por aumentar os lucros adicionando açúcar cristal ao processo, o que permite dobrar a produção, embora com perda de sabor. Por isso se queixa de clientes que reclamam ao ter de pagar R$5 por uma rapadura. Certamente não fariam isso se conhecessem o trabalho árduo necessário para produzir uma rapadura de qualidade…
Quer aprender a preparar uma caipirinha feita com rapadura? O aluno do curso de gastronomia do Senac Campos do Jordão Gabriel Ribeiro desenvolveu uma receita com a Cachaça Doce Paixão, de Passa Quatro. Confira aqui!