Renata Del Vecchio

Pindamonhangaba

Resgate de tradições, tecnologia na produção rural e a relação harmoniosa entre quem produz e quem transforma o alimento. Mais uma vez, a Fazenda Coruputuba, em Pindamonhangaba, foi cenário de um almoço que reforça a ideia: precisamos repensar a indústria da alimentação e o caminho está em voltar nossas atenções pa ra o homem do campo.

Pelo menos é isso que os melhores chefs de cozinha do Brasil têm feito ao buscar no Vale do Paraíba alimentos que ficaram esquecidos na história e agora reconquistam seus espaços por meio de um processo sustentável.

Depois de duas edições do “Caminhos do Rio Paraíba” (em 2014 e 2015), o destaque foi a carne no 1º Festival Cultural de Carnes e Embutidos do Vale do Paraíba, que aconteceu no dia 9 de julho.

Estavam lá o chef Daniel Redondo, do premiado Maní, Gabriel Broide, do restaurante Mina, Luiz Campiglia, do Paribar, Luiz Fiori, da Academia do Churrasco, Mario Portella, mineiro mestre em embutidos, e Mario Luiz Borges, ex-Les Artistes, que encabeça um projeto de olericultura orgânica no distrito de Quiririm, Taubaté.

Menu. É impossível eleger a melhor receita do Festival. Ainda assim, quem é fã de bacon vai compreender que merece destaque um aperitivo feito com esta delícia, grelhado com missô de pinhão, ideia de Gabriel Broide que foi servida com um “relish” de cebolinha, pimenta dedo-de-moça, gengibre e óleo de gergelim.

As costelas de fogo de chão, as paletas de cordeiro sendo assadas ao ar livre, assim como o leitão no rolete e o porco de tacho, este último, representando muito bem a culinária regional e tropeira, eram de encher os olhos e dar água na boca. “O leitão foi criado de maneira correta e sustentável. Uma parte dele foi assada com madeiras certificadas e cultivadas na fazenda como, o Guanandi. Inicialmente, a receita foi aromatizada com essas madeiras. Depois, colocamos carvão que também é produzido próximo à fazenda”, disse Mario Borges.

Ele explicou, também, que a cocção lenta aumentou ainda mais característica de carne macia que o leitão caipira possui. “A ideia é essa: resgatar o que tem de bom na região. O leitão é criado solto, em contato com a natureza”, disse.

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O arroz, alimento que fez importantes chefs voltarem seus olhares para o Vale do Paraíba, também estava presente no Festival de Carnes pelas mãos de Daniel Redondo, que serviu uma espécie de arroz carreteiro, claro, com o seu toque espanhol, e Luiz Campiglia, que acertou no arroz jasmim feito com cupim e ervas da fazenda.

Outro ponto alto do encontro foi quando Broide retirou debaixo da terra os legumes que foram enterrados e cobertos com brasa. “Eles entraram às 9h30 e, desde então, estão aí com fogo em cima, pegando calor. Agora, serão servidos com esse molho que é uma coalhada que faço com leite cru e gergelim”, contou.

Tudo harmonizado com chope puro malte da Karavelle, cervejaria paulistana que criou versões da bebida utilizando plantas da fazenda Coruputuba, como vinagreira, manjericão e cúrcuma, além dos drinques de uma bike de caipirinhas, chamada “Umas e Outras”, projeto que apresentaremos em outra matéria.

Reflexão.
Apesar de servir carnes, o evento também chamou a atenção para questões como a produção de carne mais amiga do meio ambiente, diminuindo as áreas de pastagens, incentivando o uso racional dos nossos recursos e o combate ao desperdício e à desigualdade social. Alex Atala, por exemplo, que também é parceiro da fazenda Coruputuba e esteve presente na primeira edição do encontro, há tempos vem defendendo essas ideias.

“Você comer carne não significa que você tem que comer isso em quantidade, mas, sim, como uma forma de satisfação, de apreciar a boa gastronomia. Dentro deste conceito, nós fomos habituados a comer proteína através da carne porque desconhecemos, por exemplo, que a ora-pro-nóbis tem 30% de proteína. Porém, uma série de questões influenciam neste processo de transição”, explicou Mario Borges.

Para Broide, ainda está longe da realidade atender a demanda de alimentação do mundo com boas práticas e isso não apenas quando se trata do consumo de carnes. “Quem bom seria se os bichos fossem todos criados soltos, mas você não consegue atender a demanda mundial, assim como produzir vegetais sem agrotóxicos. Os seres humanos consomem o mundo. Então, se você possui muita grana, vai consumir coisas de um mercado ultraorgânico. Se não tiver, vai comer aquilo que vem na sua cesta básica, aquilo que o seu emprego lhe oferece”.

O especialista em olericultura orgânica, Mario Luiz Borges, concorda. “Temos sete bilhões de pessoas no planeta. Uma transição para diminuir o consumo, para a preservação e para o equilíbrio sustentável, requer estrutura, informação, políticas públicas que incentivem esta transição. Hoje, não conseguimos atender a demanda do planeta com a produção natural, com produto agroeco-lógico. Precisamos realmente avançar, mas cientes da carência de alimentos”.

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Jornalista, apaixonado por gastronomia e ainda mais por comer! Idealizador do Degusta Vale e editor do portal.

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